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segunda-feira, 31 de outubro de 2022

A rua me ensinou...

Estava lembrando da minha infância e de como o que aprendi na rua levo para a vida. Cresci em uma rua repleta de meninos, só havia meninos na verdade, o nome da rua era "Theodoro Marques Pinto" e então a piada estava pronta rs. Além dos meninos da rua vinha os da rua debaixo, de cima e de outras ruas. As meninas eram esporádicas, as poucas que moraram lá foi por um curto período de tempo e não entendiam a maneira que me relacionava com os meninos, pois elas os viam com olhar romântico.

Éramos como irmãos, com os meninos que cresci, não me relacionei de uma forma que não fosse amizade. Era bem bacana, tinhamos alguns combinados que nunca dizemos explicitamente, mas funcionava muito bem para nós.

Um desses era que a vontade que prevalecia era a do grupo, então tínhamos acordos coletivos em busca do bem comum, os meninos da rua e a Aline não brigavam, era tudo muito bem acordado. Os encontros era na frente da minha casa, pois se não fosse minha mãe não deixaria eu estar na rua...Eu era a dona dos jogos mais legais e da bola de bete, mas isso não me fazia a dona da rua e eu não deixava de brincar quando perdia, mas continuava e emprestava esses jogos e bola quando necessário. 

Com três desses meninos, conheci desde bebês, o que fez com que tivessêmos passado muitos e muitos momentos juntos (sufocos também haha). Nossos pais também eram amigos e nos fins de semana a gente estava junto nos churrascos da vida e até hoje quando nos encontramos temos uma intimidade de amizade bem profunda.

Voltando aos combinados, havia outro oculto, saiu na rua comendo algo tem que dividir, o L. se mudou depois, não entendeu muito isso e então apanhava dos meninos da rua e era excluído constantemente da rua. Além disso, o L. demonstrava uma paixão pela Aline, a única menina da rua, o que fez com que ele também não fosse visto como parte desse grupo da rua, L. não entendia que Aline era como irmã na rua?

Na rua a gente escolhia junto o que iríamos brincar, se algo fosse prejudicar o colega a gente mudava as regras, exemplo, esconde-esconde? A gente combinava até onde poderia ir para a mãe do E. não ficar brava. Andar de bicicleta? Era sempre na rua porque a mãe da Aline não deixava ela ir em outra rua. E por aí vai.

Quando a gente brincava um na casa do outro, havia combinados eles brincavam de casinha e depois eu brincava do que eles queriam. Nas férias, eles iam na EBD comigo e todos os meninos da rua foram na igreja comigo ao mínimo uma vez.

Por ser a única menina, eles tinham um respeito enorme, não falavam palavrões na minha frente, se soltavam algum pediam desculpas e se chegava algum novo elemento na rua, eles logo diziam "Ei, não está vendo a Aline aqui, cuidado em como fala, respeita a menina". Apesar disso, contavam-me tudo das suas vivências, com cuidado para não serem escrotos demais rs e como estivemos na adolescência juntos, aos poucos as brincadeiras da rua foram transformadas em rodas de conversas e confidências.

Eles apesar de bem lembrarem que eu era menina  e assim seguravam os palavrões, esqueciam no compartilhar das ideias e de como viam as futuras pretendentes. Com isso, cresci bem esperta no universo masculino, sabendo que as ações dos meninos vale muito mais que qualquer palavra, sabendo que eles avaliam as meninas nas suas cabeças e colocam em caixas de formas de relacionamentos e sabendo que se eles queriam algo com as meninas, davam um jeito e não desculpas. Não bastando isso, eles checavam os meninos que eu estava me relacionando ou que eu poderia me relacionar e me alertavam caso necessário. Ah e quando comecei a vir da escola sozinha à noite? Eles faziam questão de dizer para minha mãe com qual menino eu estava vindo rsrs, pois o correto era nesses momentos vir com eles.

A rua me ensinou tanto que não cabe aqui....Mas principalmente me ensinou que essa história de vai ser do meu jeito não dava certo, era do melhor jeito para todos e se necessário havia esforços para a busca do funcionamento da rua rsrs Afinal, ter a presença dos meninos da rua e da Aline, era mais importante e então valia as mudanças pessoais em busca do bem comum, 

A rua também me ensinou que meninos podem ser cruéis, aptos a mentir com facilidade e então protegendo-me passei a pensar um pouco como menino e desenvolver um pouco da masculinidade tóxica que lutei para deixar de lado anos atrás...

A rua me ensinou tanto, livrou-me de passar por péssimos bocados com os meninos e cá estou eu agora falando para a Aline atual, a que viveu 3 décadas:

"Ei menina, acorda, a rua te ensinou e você está esquecendo? Acorda, você é muito mais que um menino, você é muito mais que uma mentira contada, você é muito mais que isso e nunca aceitou menos do que merecia, você sabe o caminho, você sabe para onde olhar ao invés de ouvir. As ações perpassam as falas..."


A rua me ensinou, fez-me forte, fez-me uma menina com cabeça de menino, uma mistura bem singular de Aline, que como já foi descrita por tantas pessoas, une de uma forma única:

 DELICADEZA COM FIRMEZA E CORAGEM!


 


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